14 abril 2014

"...M'espanto às vezes, outras m'avergonho " (Sá de Miranda)

Rui Tavares e a sua inovadora
e deslumbrante aritmética



A crónica de Rui Tavares hoje no Público arranca assim (sublinhados meus):«Há uns meses ouvi a historiadora Luísa Tiago de Oliveira resumir as teses do Congresso da Oposição Democrática de 1973, em Aveiro. O pormenor que mais chamou a minha atenção foi este: nas conclusões daquele encontro, a um ano do fim da ditadura, a existência de partidos políticos foi apenas mencionada uma vez, num parágrafo que também incluía cineclubes e sociedades recreativas. Entretanto, 44 linhas mais à frente, Rui Tavares já sentencia :  «Com a ditadura a durar bem mais do que uma geração, os laços de memória perderam-se e com eles a cultura partidária e parlamentar na grande maioria da população. Talvez por isso em Aveiro, em 1973, o caderno de encargos da oposição democrática se tenha esquecido dos partidos.».

Sublinhando que, por clássica desarrumação, não encontro agora o volume das conclusões do 3º COD na parte referente à situação política e por isso nem me importo de  dar como boa a descrição inicial de Rui Tavares, sinto-me na obrigação política e moral de anotar o seguinte:

1. Nem quero comentar que curtos-circuitos se estabelecem na cabeça de alguém que num sítio reconhece que as conclusões daquele Congresso de referem «uma vez» aos partidos políticos e noutro sítio já conclui que o «caderno de encargos  da oposição democrática se tenha esquecido dos partidos». 

2. Também não quero, por delicadeza pessoal e piedade política, demorar-me nesta tese implicita de Rui Tavares segundo a qual o que conta é o número de vezes que uma reivindicação política crucial é formulada e que leva o autor a considerar que uma vez é pouco e igual a zero, sem ter a caridade de nos explicar qantas vezes é que já estaria bem.

3. Quero sim dizer sobretudo que me parece muito penoso, desgostante e desagradável ver alguém que até é historiador a não perceber que, para além de tudo o mais, com todo o património de décadas da oposição democrática, quer de denúncia da ausência de liberdade (incluindo a proibição de partidos) quer de reivindicações políticas  como «a conquista da liberdade» e, concretamente, da liberdade «de organização política» (constantemente referida em teses ao 3º COD) , a livre formação e existência de partidos políticos fazia obviamente parte do programa da oposição democrática, como os fascistas alías muito bem sabiam e temiam.

Adenda em 15/4:
Na caixa de comentários, munido da documentação do 3º Congresso da Oposição Democrátiva, o leitor Victor Nogueira presta algumas relevantes esclarecimentos de que destaco o seguinte:



5 comentários:

  1. Há espécimes cujos cromossomas falecem momentos antes do nascimento. Normalmente são vendidos em mercados imundos, onde a posta, sem qualquer valor acima de chicharro, é vendida por corvina em campanhas promocionais. Ou direi eleitorais? Rui Tavares é empregado. O dono da peixaria é que lhe ensinou o pregão.

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  2. Que um historiador se baseie no "resumo" que ouviu acerca do "resumo" das teses sem consultar os documentos originais é de assinalar como é de assinalar que tenha retido apenas o que classifica ser "um pormenor" nas mais de mil páginas dos 4 volumes com as teses e conclusões do referido Congresso, contendo a caracterização do regime fascista e os objectivos da luta da oposição em variadíssimos campos como os da Segurança Social e Saúde, Urbanismo e Habitação, Desenvolvimento Económico e Social e Situação e Perspectiva Política no Plano Nacional e Internacional.
    Nas tais teses até figuram os 3 D's - Democratizar, Desenvolver, Descolonizar . No volume de 458 páginas dedicado à 8ª Secção [Situação e Perspectiva Política no Plano Nacional e Internacional] contendo as comunicações e as conclusões, nestas, no ponto 4 "Para uma Alternativa Democrática" (página 455) lê-se "A democracia portuguesa basear-se-á no respeito da legalidade democrática e garantirá a neutralidade doutrinária do Estado, um regime ilimitadamente pluripartidário e vigência das liberdades públicas, a representação do poder por delegação representativa do sufrágio universal, a separação de poderes (...) " As Conclusões desta 8ª secção ocupam 17 (dezassete) páginas.
    Mas se nos reportarmos ao volume exclusivamente dedicado às Conclusões” de todas e cada uma das secções, elas estendem-se por 157 páginas. e os seguintes capítulos 1. Desenvolvimento Económico e Social, 2. – Estrutura e Transformação das Relações de Trabalho, 3. – Segurança Social e Saúde, 4. – Urbanismo e Habitação, 5. – Educação, Cultura e Juventude, 6. – Desenvolvimento Regional e Administração Local, 7. – Organização do Estado e Direitos do Homem, 8. – Situação e Perspectivas Políticas no Plano Nacional e Internacional.
    Na página parte da “Organização do Estado e Direitos do Homem” na alínea A, capítulo I, secção I, alínea d) Lê-se “No Estado democrático (…) impõe-se que o Presidente da República emane directamente da vontade popular (…) expressa em eleições verdadeiramente livres, sem quaisquer discriminações políticas, de crença, de partidos, de sexo ou de condições sociais.” e no capítulo II, dedicado às Liberdades democráticas, nºs 2 e 3, lê-se “”Ao futuro Estado de Direito incumbe respeitar a liberdade de reunião, como forma dos cidadãos livremente poderem debater os problemas da comunidade, associando-se em orgaismos actuantes entre os quais figuram, pela sua índole, os partidos políticos, sem esquecer outras fórmulas onde tais direitos se podem expressar utilmente como sejam as cooperativas, associações culturais, cine-clubes, associações de estudantes e outras. Prentende-se assim extermnar as raízes autoritárias do fascismo português, proibindo os partidos, limitando o poder das cooperativas e disciplinando o funcionamento de associações culturais no intuito de as colocar sob o controle e fiscalização das polícias.” seguindo-se uma alínea b) onde se reivindica o direito de associação sem limitações (páginas 120/121) E nas CONCLUSÕES FINAIS, corolário das conclusões das várias secções, refere-se como um dos objectivos a “conquista das liberdades democráticas” (pág 154),
    Para além da ligeireza da fundamentação de Rui Tavares que aparentemente se fica por resumos de orelha, a expressão “cader no de encargos” como referência às CONCLUSÕES parcelares e gerais do Congresso parece-me expressivamente … “apoucadora”

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  3. Já sei em quem é q vou votar.Livra!!!!!
    Já basta o durão barroso.....

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  4. Ainda o artigo "Os Partidos" de Rui Tavares

    Parece-me que o cerne da questão para RT está expresso no seguinte:

    «Mal nos damos conta, mas naqueles primeiros dias de abril de 1973 só havia verdadeiramente um partido assumido como tal no país, e estava ilegalizado: o Partido Comunista Português, fundado em 1921, ainda durante a I República. (...) E só duas semanas depois do Congresso de Aveiro foi fundado o Partido Socialista, no exílio. Os restantes partidos e seus sucessores que temos até hoje nasceram, quase todos, nos meses e anos logo após o 25 de abril de 1974.»

    E prossegue RT «Ao contrário de outros países europeus que tiveram ditaduras mas cujos partidos históricos sobreviveram (o SPD na Alemanha, fundado em 1875, o PSOE em Espanha, fundado em 1879), Portugal não tem partidos nem sucessores das suas anteriores tentativas democráticas — com a já referida exceção do PCP.»

    Há pequenos pormenores que RT não desvenda: O PCE na clandestinidade teve uma actividade muito nsuperior à do PSOE, apesar da repressão fascista, e na Alemanha Nazi o PCA foi duramente reprimido e os seus militantes e dirigentes enviados para campos de concentração. Após a derrota do nazi-fascismo, o PCE “euro-comunizou-se” e “desapareceu” e o PCA na RFA entre 1956 e 1968 esteve ilegalizado, apesar de em condições muito difíceis não ter deixado de agir na clandestinidade contra o nacional-socialismo desde a ascenção deste ao poder.

    Ao contrário do PCP em Portugal, os PC’s espanhol e alemão tornaram-se organizações políticas neglicenciáveis do ponto de vista eleitoral. Talvez seja por este pequeno pormenor que RT apenas refere os partidos sociais democratas.

    Tendo em conta que em 1973 só existia o PCP, talvez RT entenda que é por isso que «em Aveiro, em 1973, o caderno de encargos da oposição democrática se tenha esquecido dos partidos.» Poder-se-à concluir que segundo RT já neessa altura o PCP já se preparava para assaltar o Poder e instaurar uma “ditadura” de partido único ?

    O actual descrédito da democracia, do parlamentarismo e dos processos eleitorais resultaria de 3 facores: a ditadura fascista, não ter havido na clandestinidade outros partidos senão o PCP e o Congresso de Aveiro,RT, historiador,publicista e político.

    Fosse Borges vivo e historiador - como professor catedrático – conseguiri RT passar do 1º ano do curso?

    Não batendo a bota cxom a perdigota, conclui RT « Agora que a democracia se começa a aproximar em anos da ditadura, a relutância dos nossos partidos em se credibilizarem pela abertura é a nossa pior inimiga política.»

    Pronto, eis um possível corolário do cerne: RT foi eleito nas listas do BE com a campanha eleitoral paga pelo BE com quem se desavindou e não entregou o lugar no PE. E resolveu fundar o LIVRE como projecto pessoal para se manter no PE, para isso tentando que entre outros o BE e o PCP revelassem “abertura” para se diluírem no LIVRE com RT em lugar elegível ? honni soit qui mal y pense!

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  5. E se Rui Tavares nos explicasse o essencial: quando votou e apoiou a invasão da Líbia, e os consequentes massacres de milhares de líbios, decidiu com base nos mesmos crítérios com que escreveu o artigo ?

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