«Credíveis» - um adjectivo
recorrente mas muito enganoso
recorrente mas muito enganoso
No Diário Económico online, encontro estas afirmações de Francisco Louçã:
«A esquerda tem défices. Tem tido pouca preocupação em apresentar soluções credíveis e suportadas por aquilo em que a esquerda é mais forte que são as respostas de mobilização. Por exemplo, o sucesso do António Chora como presidente da comissão de trabalhadores da Autoeuropa, na capacidade de negociar e defender os trabalhadores precários, é um exemplo para a esquerda inteira e uma grande conquista do Bloco de Esquerda. Além disso, é necessário passar da grandeza dessa luta para dizer que governar é tomar decisões. A esquerda ainda não foi protagonista disso. O Bloco de Esquerda, tal como outras forças de esquerda, deve fazer muito mais trabalho nesse sentido. Por isso, o movimento pela reestruturação da dívida é tão importante. Ele indica primeiro que é possível, segundo que tem alianças e terceiro que é uma solução. Um governo que hoje se apresente com esta resposta, se puder conjugar todos aqueles que com ele concordam, pode mudar o mapa político português. A disputa que importa passa por procurarmos lideranças e isso significa ter uma solução para Portugal. O Governo diz-nos que Portugal é inviável. A grande tarefa cultural da esquerda é destruir a ideia da inviabilidade. Portugal é viável como democracia, com responsabilidade social.»
Para não obnubilar o essencial, deixo de parte a pergunta sobre o que se diria se o PCP proclamasse como sua «conquista» a actuação de qualquer Comissão de Trabalhadores e, num estrito plano de leal debate de ideias, quero ater-me a dois pontos que me parecem mais relevantes:
Tal como tem vindo a ser feito repetidamente por outras personalidades de esquerda, também nestas declarações Francisco Louçã vem escolher o adjectivo «credíveis» para o apor a «soluções». Tivesse Louçã usado o adjectivo «aprofundadas», «consistentes» ou «coerentes» e a minha divergência seria de outra natureza. Mas como escolheu o «credíveis», embora eu saiba que certamente Louçã não se situa nesse território, eu sinto a necessidade de lembrar que, no debate político nacional, este adjectivo de recurso fácil está profundamente envenenado, não se podendo ignorar que tem todo um lastro do género «credíveis são as minhas, as tuas nunca o são» e, em concreto, está radicalmente contaminado pelo uso que PSD, CDS e PS dele têm feito para desqualificar as propostas do PCP e do BE. E também cabe lembrar que, em muitos, a mais frequente tradução de «credíveis» tem sido a de «moderadas» ou «muito moderadas» ou, mais especificamente, aceitáveis pelo PS. Porque há uma pergunta incómoda que se impõe: «credíveis» para quem ? É que uma coisa ser redonda ou quadrada não é da mesma natureza que certas soluções serem «credíveis» ou «não credíveis» na exacta medida em que todos os juízos sobre «credibilidade» relevam da subjectividade ( e dos interesses, valores e opiniões individuais que lhe subjazem) de quem é chamado fazer tais juízos. E, depois, sem obviamente negar que as forças mais à esquerda têm sobre os seus ombros a responsabilidade de aprofundarem as suas propostas sobre problemas cuja complexidade cresce constantemente (mas aqui não se deve esquecer que os partidos do governo se podem aproveitar partidariamente e nas calmas do trabalho de milhares de quadros da administração pública e da máquina do Estado), talvez convenha enfrentar a dolorosa realidade de que os partidos mais à esquerda do que mais sofrem não é da falta de credibilidade das suas propostas mas do facto de grande parte do eleitorado, esquecido do seu próprio papel e poder, interiorizar que não terão os votos necessários para governar o país e concretizar as suas propostas.
Mas talvez a minha maior surpresa nestas declarações de Francisco Louçã esteja no que diz sobre «o movimento pela reestruturação da dívida». É que julgava eu que aquela iniciativa, que a meu ver tem méritos, traduzia a convergência de personalidades de diversas sensibilidades políticas (embora, ao que parece, o PS não lhe tenha dado grande aval de «credibilidade») em torno de uma questão concreta embora de enorme importância. Não, o que Louçã explicitamente vem dizer, no contexto indiscutível de referência ao «movimento pela reestruração da dívida», é que «Um governo que hoje se apresente com esta resposta, se puder
conjugar todos aqueles que com ele [movimento] concordam, pode mudar o mapa político
português». Ora, mesmo deixando de lado a bicuda questão do PS a que já aludi ao de leve, é este projecto político que a mim não me parece apenas inviável e pouco sensato como sobretudo me parece a milhas da alternativa de esquerda porque é preciso lutar e que terá de enfrentar, para além da dívida, muitos outros problemas cruciais da sociedade portuguesa.
«A esquerda tem défices. Tem tido pouca preocupação em apresentar soluções credíveis e suportadas por aquilo em que a esquerda é mais forte que são as respostas de mobilização. Por exemplo, o sucesso do António Chora como presidente da comissão de trabalhadores da Autoeuropa, na capacidade de negociar e defender os trabalhadores precários, é um exemplo para a esquerda inteira e uma grande conquista do Bloco de Esquerda. Além disso, é necessário passar da grandeza dessa luta para dizer que governar é tomar decisões. A esquerda ainda não foi protagonista disso. O Bloco de Esquerda, tal como outras forças de esquerda, deve fazer muito mais trabalho nesse sentido. Por isso, o movimento pela reestruturação da dívida é tão importante. Ele indica primeiro que é possível, segundo que tem alianças e terceiro que é uma solução. Um governo que hoje se apresente com esta resposta, se puder conjugar todos aqueles que com ele concordam, pode mudar o mapa político português. A disputa que importa passa por procurarmos lideranças e isso significa ter uma solução para Portugal. O Governo diz-nos que Portugal é inviável. A grande tarefa cultural da esquerda é destruir a ideia da inviabilidade. Portugal é viável como democracia, com responsabilidade social.»
Para não obnubilar o essencial, deixo de parte a pergunta sobre o que se diria se o PCP proclamasse como sua «conquista» a actuação de qualquer Comissão de Trabalhadores e, num estrito plano de leal debate de ideias, quero ater-me a dois pontos que me parecem mais relevantes:
Tal como tem vindo a ser feito repetidamente por outras personalidades de esquerda, também nestas declarações Francisco Louçã vem escolher o adjectivo «credíveis» para o apor a «soluções». Tivesse Louçã usado o adjectivo «aprofundadas», «consistentes» ou «coerentes» e a minha divergência seria de outra natureza. Mas como escolheu o «credíveis», embora eu saiba que certamente Louçã não se situa nesse território, eu sinto a necessidade de lembrar que, no debate político nacional, este adjectivo de recurso fácil está profundamente envenenado, não se podendo ignorar que tem todo um lastro do género «credíveis são as minhas, as tuas nunca o são» e, em concreto, está radicalmente contaminado pelo uso que PSD, CDS e PS dele têm feito para desqualificar as propostas do PCP e do BE. E também cabe lembrar que, em muitos, a mais frequente tradução de «credíveis» tem sido a de «moderadas» ou «muito moderadas» ou, mais especificamente, aceitáveis pelo PS. Porque há uma pergunta incómoda que se impõe: «credíveis» para quem ? É que uma coisa ser redonda ou quadrada não é da mesma natureza que certas soluções serem «credíveis» ou «não credíveis» na exacta medida em que todos os juízos sobre «credibilidade» relevam da subjectividade ( e dos interesses, valores e opiniões individuais que lhe subjazem) de quem é chamado fazer tais juízos. E, depois, sem obviamente negar que as forças mais à esquerda têm sobre os seus ombros a responsabilidade de aprofundarem as suas propostas sobre problemas cuja complexidade cresce constantemente (mas aqui não se deve esquecer que os partidos do governo se podem aproveitar partidariamente e nas calmas do trabalho de milhares de quadros da administração pública e da máquina do Estado), talvez convenha enfrentar a dolorosa realidade de que os partidos mais à esquerda do que mais sofrem não é da falta de credibilidade das suas propostas mas do facto de grande parte do eleitorado, esquecido do seu próprio papel e poder, interiorizar que não terão os votos necessários para governar o país e concretizar as suas propostas.
Se Cavaco lá continua é pk houve uma grande "salgalhada" em torno das candidaturas de Fernando Nobre e de Manuel Alegre à Presidência da República, estes apoiado pelo PS/Sócrates e BE. E se Pedro e Paulo do psd/cds continuam seguros, é pk Cavaco não convocou eleições antecipadas, de que o PS/Seguro foge como o diabo da cruz.
ResponderEliminarA "credibilidade" não é um valor em si, antes mede-se em função dos objectivos que as propostas em confronto ou em debate apresentam ou defendem. Que irão satisfazer estes ou aqueles grupos ou classes sociais. Com clareza ou com artimanha.
Regista-se que ainda com eleições europeias e legislativas de permeio, mais ou menos aparentemente, Louçã e Vasco Lourenço já se "disponibilizam" ou pretendem vir a ser candidatos a candidatos à Presidência da República.
O mapa político há muito está definido - por um lado a generalidade dos trabalhadores e das populações, isto é, formando classes, camadas e grupos sociais com interesses divergentes ou antagónicos e graus diferenciados de consciência social. E do outro lado os detentores dos meios de produção formando camadas sociais com interesses aparentemente convergentes.O resto é a expressão organizada em associações políticas (partidos e movimentos) ou socio-profissionais.(sindicais, de trabalhadores ou patronais). Entre outras.