Outros afazeres mais ou menos conhecidos impedem-me de comentar devidamente o artigo que, hoje no Público, o sociólogo Elísio Estanque dedica ao PCP sob o título «O partido "bipolar": uma crítica de esquerda».
Nesse contexto, sendo certo que não deixei de registar um certa elegância na forma (tirando o título ) e até diversos elogios à acção e história do PCP, há entretanto um ponto nuclear e estruturante que, de imediato, não posso deixar a passar em claro.
É que Elísio Estanque escreve a dado passo que «o modelo soviético nunca foi, tanto quanto se sabe, objecto de uma reflexão séria por parte do partido».
Perante esta afirmação, e embora sublinhando que as reflexões sérias idealmente não têm fim, temo que seja legítimo pensar que Elísio Estanque nunca leu designadamente :
- «O Partido com Paredes de Vidro» de Álvaro Cunhal, publicado em 1986 (mas de redacção anterior à «perestroika») onde se defendem múltiplas concepções que não é preciso ser sociólogo para perceber que são um implícito mas, apesar disso, óbvio distanciamento de algumas das principais perversões que mancharam projectos de edificação do socialismo;
- a Resolução Política do XIII Congresso (Extraordinário), realizado em Maio de 1990 ( e depois completada com a do XIV Congresso) em que o seu núcleo central é a análise crítica e autocrítica dos problemas e evolução dos países socialistas, a começar pela URSS;
- O Programa do PCP em vigor que não só volta a condensar as análises críticas já referidas como expõe com apreciável desenvolvimento as características do socialismo que o PCP defende para Portugal e, ponto muito importante, estabelece dialecticamente a interligação, a anos-luz de qualquer bipolariedade, entre a luta do PCP na actualidade, a sua luta pela democracia avançada e a sua luta pelo socialismo.
Se não for aborrecido ou demorado demais, convém pois ler antes de escrever certas coisas. Passar bem.