Um adjectivo só para o PCP
O editorial do DN de hoje , dedicado ao Congresso do PCP, e
de feição apesar de tudo moderada, intitula-se «o partido prevísivel». O
editorial obviamente não se dá ao trabalho de me explicar e demonstrar em que é
que o PSD, o CDS, o PS e o BE são imprevísiveis, coisa que me dava jeito porque
eu, em 90% dos casos, consigo sempre prever o seu discurso, atitudes e
orientações.
De
qualquer modo, atrevo-me a
imaginar uma notícia de jornal sobre a abertura do Congresso do PCP que teria
poupado o PCP a este labéu de «partido prevísivel». Rezaria assim :
"FINALMENTE, UM
PARTIDO IMPREVÍSIVEL-
Jerónimo anuncia viragem de 180 graus na política do PCP
Talvez sinal dos tempos que vivemos, o «impossível» ou
«imprevísivel» aconteceu ontem na abertura do XIX Congresso do PCP com uma fria
e surpreendida reacção dos delegados ao discurso de abertura do Secretário-geral.
Com efeito, o primeiro sinal foi logo dado no quinto parágrafo
do longo discurso de Jerónimo de Sousa quando este afirmou que «nos dias de hoje, ser revolucionário e
consequentemente de esquerda não é construir um mundo imaginário de objectivos
que se chocam com a realidade mas sim ter em conta e promover as adaptações
necessárias aos factos consumados por mais que tenhamos lutado contra eles e os
tenhamos considerado indesejáveis e condenáveis».
Mais à frente, uma corrente gelada percorreu o Congresso quando Jerónimo
de Sousa explicou que «perante os perigos
imensos e o terrível processo de empobrecimento nacional contido nas
orientações e medidas governamentais, a grande e realista tarefa e objectivo não pode ser a
urgente derrota desta política e deste governo mas apenas a contenção de alguns
dos seus aspectos mais gravosos, não
pode ser a recusa global do memorando com a troika mas a conquista dos
ajustamentos e rectificações possíveis».
E, logo a seguir, numa declaração que deve ter provocado
calafrios na delegação da CGTP que assistia aos trabalhos, o Secretário-geral
do PCP, embora reafirmando a solidariedade do PCP com as lutas dos
trabalhadores, salientou ser necessário que «a
par delas, seja dada uma nova centralidade ao diálogo na concertação social».
Também em matéria de alternativa política, o Secretário-geral do
PCP surpreendeu os delegados ao afirmar que «na
situação de emergência nacional que vivemos e com vista à conquista de um
futuro governo patriótico e de esquerda, o PCP está disponível para começar do
zero o seu diálogo com o PS, esquecendo todas as medidas gravosas adoptadas nos
governos de Sócrates e todos os acordos e convergências já verificados entre o
PS e o actual governo, não pretendendo colocar em cima da mesa de eventuais
negociações com o PS a questão da revogação dessas medidas já entradas em
vigor».
Ao intervalo, as conversas dos delegados e as expressões destes
faziam prever uma sua viva contestação na sessão da tarde a esta
anunciada viragem na orientação do PCP que, por esta via e ao menos por uma
vez, o transformaram finalmente num «partido imprevísivel.»
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