16 maio 2022

Espirito crítico precisa-se

 Lúcidas palavras
contra a corrente

« E isso é facilitado por uma coisa que já antes aqui escrevi e que tem passado tranquilamente face à indiferença geral: estamos perante a mais unilateral cobertura mediática de um conflito a que alguma vez assisti. Não culpo por isso directamente a imprensa ou os jornalistas, que relatam o que vêm e o melhor que podem, cumprindo a sua missão de denunciar o horror de uma guerra e o estendal de morte e destruição que a Rússia levou à Ucrânia. A questão é que eles estão apenas junto de um dos lados e reportando apenas aquilo que esse lado deixa e só depois de as coisas acontecerem: não assistem aos combates nem aos invocados massacres, não falam com o outro lado nem têm acesso à sua versão do mesmo acontecimento. E é sobre isso que depois os “analistas” e os “especialistas” extraem as suas conclusões, sempre de sentido único.

Um bom exemplo disso é o que se passou com os civis encurralados com os militares na fábrica Azovstal, em Mariupol. Durante dois meses foi-nos contado que mais de 1200 civis, mulheres e crianças, estavam refugiados nos subterrâneos da Azovstal, impedidos de sair pelos russos, que violavam sistematicamente todos os acordos de evacuação estabelecidos, incluindo os propostos pelos próprios russos. Ninguém nunca contestou a versão ucraniana e ninguém no terreno a confirmou. Mas quando António Guterres conseguiu colocar pessoal da ONU em Azovstal, em dois ou três dias, como que por milagre, todos os civis que quiseram foram evacuados sem qualquer incidente. A pergunta é: por que razão nunca alguém levantou a hipótese de os civis estarem a ser retidos pelos próprios militares do Batalhão Azov, que os usou como escudo, tentando assim garantir uma coisa impossível na guerra — saírem em liberdade juntamente com os civis sem terem de se render? O mesmo aconteceu em relação às incansáveis imagens de destruição de edifícios civis bombardeados pelos russos e às infindáveis entrevistas aos sobreviventes civis desses bombardeamentos. As imagens são tão revoltantes como as de qualquer outro conflito, como no Iémen ou na Síria, só que aqui, em maior escala e diariamente filmadas por centenas de jornalistas, transmitem uma narrativa de absoluto caos e de destruição quase sem precedentes. Em contrapartida, são escamoteadas quaisquer imagens dos alvos militares onde se sabe que os russos têm concentrado o grosso dos seus bombardeamentos, de modo a passar a ideia de que o alvo é indiscriminado e atinge sobretudo civis. E, todavia, segundo os números divulgados pela ONU em 9 de Maio, morreram na Ucrânia, ao fim de 75 dias de guerra, 3381 civis, embora estes números possam vir a ser “consideravelmente maiores”. Mas sabem quantos civis morreram no bombardeamento aéreo de dois dias dos Aliados a Dresden, durante a II Guerra Mundial? 22 mil. E em Hamburgo 50 mil. E 100 mil em Hiroxima e 70 mil em Nagasáqui, só no primeiro dia após despejada a bomba atómica, sem que em nenhum caso se tenha falado em “crimes de guerra” ou em “genocídio”, como agora se fala a propósito dos mortos civis na Ucrânia.» - Miguel Sousa Tavares no ultimo «Expresso».

2 comentários:

  1. Sim, embora existem algumas mentiras escritas por Miguel Sousa Tavares que querem ser passadas como verdades, como por exemplo esta de «...a sua missão de denunciar o horror de uma guerra e o estendal de morte e destruição que a Rússia levou à Ucrânia.» Na verdade e estando informado sobre a operação militar desde o seu início, não vi nada disso. Antes vi o exército ucraniano, em conjunto com a sua polícia de segurança provocar esse «estendal de morte e destruição».
    Quanto ao facto de o mesmo exército ucraniano ter depositado cerca de 49 toneladas de explosivos numa fábrica de químicos (em Novoselytsya), para provocar uma catástrofe humana e culpabilizar a Rússia, não vi Miguel Sousa Tavares falar do assunto, como também sobre os testemunhos recolhidos pelo exército russo e da República Popular do Donetsk junto dos prisioneiros ucranianos, onde se recolhem factos verdadeiramente criminosos deste exército, como usar os recrutas como carne para canhão nas ações dentro do território do Donbass e uso da artilharia contra populações civis.
    Cuidado com a lucidez deste indivíduo que é bem capaz de escrever esta peça para um jornal e depois dizer algo bem diferente numa outra peça de opinião em qualquer canal televisivo.

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  2. O srº Guterres tem, quando a oportunidade surgir, a obrigação de dizer a verdade. Compreendo que não o possa fazer agora, mas fico à espera...

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