... as palavras e o seu contexto
Em artigo hoje no Público que examina o significado de José Pacheco Pereira se ter apressado a explicar que só aceitou o convite para Serralves por o seu cargo não ser remunerado, o prezado José Vítor Malheiros, escreve mias à frente o seguinte :«Tem aliás sido sintomático ver o PCP repetir à exaustão, à propósito do acordo com o PS ou da constituição do Conselho de Estado, que não está na política para conquistar cargos. Como se a conquista de determinados cargos políticos não estivesse no cerne do combate político, como se ela não fosse uma parte absolutamente legítima desse combate e não fosse essencial para a prossecução de determinadas políticas. A posição do PCP é respeitável e compreende-se que, ao fazê-lo, se dirige principalmente àqueles dos seus apoiantes menos afortunados que consideram que todos os políticos ganham fortunas. Mas o que acontece é que o PCP reforça assim, involuntariamente, a visão reaccionária popular segundo a qual a política é não a nobre dedicação ao bem comum que temos o direito de exigir que seja mas apenas uma carreira oportunista que pode ser mais rentável que todas as outras. E esta visão da política como algo desprezável e indigno alimenta a abstenção e mina a democracia.»
Se eu tivesse de fazer um comentário brevíssimo a estas linhas, eu escreveria apenas que «tanto barulho por nada!». Mas como J.V.Malheiros e os leitores merecem mais, então explico que tal afirmação do PCP não pode ser separada do contexto político presente (no qual não poucos estranhavam a falta de ministros comunistas no governo como se isso fosse separável da natureza e limites dos acordos políticos alcançados).
Creio que, com um pouco mais de ponderação, teria sido possível ao estimado JVM compreender que com isso o que o PCP quis e quer dizer é que, para si, a natureza e orientação das políticas está sempre primeiro que a mera conquista de cargos.
E creio ser bom de ver que este é o real e autêntico sentido de tal declaração dos dirigentes do PCP, tanto mais quanto é sabido que o PCP, no quadro da CDU, tem numerosos militantes ou simpatizantes seus que exercem, há quase 40 anos, os cargos de Presidentes de Câmara ou vereadores municipais.
Já todos percebemos que a razão fundamental para que a CDU não participe no Governo e apenas lhe garanta o apoio parlamentar é que, muito legitimamente, não se revê em aspetos fundamentais do Programa desse Governo (pertença ao Euro, pagamento integral da dívida, etc). O mesmo se passa em menor grau com o BE. A convergência é em torno de um Programa Mínimo, que é o quanto basta para afastar a Direita do Poder. Assim sendo, por que não simplesmente dizê-lo, sem chamar, como bem diz o José Vítor Malheiros, esta questão da ocupação dos cargos políticos à colação? Contrariamente a um certo populismo anti-parlamentar, a remuneração dos políticos foi uma importante conquista democrática, antes só os ricos podiam dar-se ao luxo de participar na governação da cidade. Aliás, o pagamento dos cidadãos que participavam em júris remonta, se não estou em erro, à Grécia Antiga.
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