30 outubro 2013

Livro de catequese sobre «a reforma do Estado»

Tudo visto, a minha síntese





E, fazendo o boneco, é assim :

Sobre o governo do poder local sem maioria absoluta

Daniel Oliveira em imitação
serôdia de Guterres em 1996



No Expresso online e no «arrastão», Daniel Oliveira, com um artigo intitulado «Vodka laranja» [expressão cujo copyright pertence ao PS] e outras aberrações» resolveu juntar o seu nome e as suas opiniões à campanha dominantemente ignorante, idiota, esquemática  e preconceituosa que por aí vai e que, significativamente, só ganhou essa expressão e categoria por causa da atribuição em Loures pela CDU (que está em maioria relativa) de pelouros a vereadores do PSD.

Sobre a questão de fundo já escrevi muito nos últimos 30 anos e, por isso, quero apenas referir três pontos:

- o primeiro é que, no caso do PCP, a orientação que admite a possibilidade de, em casos de maioria apenas relativa, a CDU (e antes a FEPU e a APU) atribuir pelouros a vereadores de outros partidos ou aceitar pelouros atribuídos pela força maioritária, numa avaliação caso a caso de condições de trabalho útil ao serviço das populações e de salvagurada da sua indepência política releva de uma concepção formulada e apurada na fundação em 1976 do poder local democrático.

- o segundo é que, exactamente ao contrário do que agora vem defender Daniel Oliveira, essa concepção do PCP sempre significou uma assumida rejeição de uma transposição ou decalque mecânicos do funcionamento do Parlamento e da sua relação com o governo do país para o poder local democrático, com base no entendimento de que neste plano local pode haver margens de entendimento, convergência ou compromisso muito superiores às do plano político nacional, convindo aqui lembrar que, na generalidade dos casos, as deliberações municipais são aprovadas com 80 ou 9o% dos votos nas vereações.

- o terceiro é que, nas opiniões de Daniel Oliveira, há uma tão pouco séria generalização de defeitos e vícios destes compromissos que, entre tantos outros exemplos constitui uma chocante ofensa a eleitos da CDU que, durante vários anos, exerceram pelouros em Câmaras com maioria PS ou PSD, como foi o caso de Ilda Figueiredo e Rui Sá no Porto ou Lino Paulo em Sintra e que, salvo as críticas sectárias do Bloco, sempre foram alvo de um grande reconhecimento pela qualidade do seu trabalho.

Mas, à parte isto, o que mais me interessa de momento é que, honra lhe seja feita, Daniel Oliveira neste seu texto não imita a legião de tontos que anda para aí a criticar a atitude da CDU em Loures mas, nunca por nunca ser, adianta o que acha que devia ser feito para superar a situação de maioria apenas relativa.

Na verdade, sobre isso, escreve Daniel Oliveira: «A alternativa a isto não é o monolitismo político. São assembleias municipais com muitíssimo mais poder do que hoje, onde a oposição possa exercer a sua função e onde se constituam as maiorias que suportam o executivo, dirigido pelo presidente eleito. Com algumas diferenças, deveria ser como acontece no governo do País. Há governo e oposição e eles não se confundem.»

Ora, a este respeito, importa salientar o seguinte:

1. Como não é possível estabelecer um sistema só para situações de maioria relativa, o que esta proposta de Daniel Oliveira significa é que ele se vêm, a meu ver escandalosamente, encostar-se  à proposta do PS então dirigido por António Guterres, velha já de 17 anos, de acabar com a eleição directa da Câmara Municipal, de formação de executivos monocolores a partir da Assembleia Municipal, que retirariam aos cidadãos o direito que têm desde 1976 de escolher os vereadores que os representem na Câmara Municipal mesmo que venham só a exercer funções de fiscalização e não o exercício de pelouros.

2. O que é verdadeiramente extraordinário é que Daniel Oliveira acabe assim por conceber a Assembleia Municipal como uma espécie de instância purificadora ou «o omo que lava mais branco». Ou seja, nas negociações directas entre partidos para resolver o problema da governabilidade das câmaras, ele vê os piores negócios e as mais detestáveis consequências, mas tudo isso feito nos bastidores ou à luz do dia das Assembleias Municipais já seria um oceano de decência, inocência e isenção.


E, por fim, só quero anotar que Daniel Oliveira, no truque injustamente generalizador, escreve também que «O sistema atual promove a traficância de cargos, o silenciamento de divergências, a diluição de responsabilidades políticas, a inexistência de controlo democrático e, porque não dizê-lo, a promoção da mais desbragada prostituição política.»

Também aqui o encosto a afirmações antigas de Guterres é tão grande que, em grande medida, a minha resposta a Daniel Oliveira, está de algum modo ímplicita na crónica que escrevi no Avante! em 25 de Maio de 2000 e que rezava assim:
  
Diga quem são

Talvez alguns leitores possam achar que as coisas já estão claras, e que não vale a pena bater mais na malfadada proposta do PS de alteração do sistema eleitoral para as autarquias.

Mas como, nesta matéria, o Secretário-geral do PS anda numa verdadeira cruzada em que, de cada vez que abre a boca, não responde seriamente a nenhuma das críticas e sempre adianta mais umas desavergonhadas mistificações, talvez seja mais prudente pensar que só se perdem as que caírem no chão.

Com efeito, António Guterres declarou no passado domingo que «o actual sistema de gestão municipal gera uma grande perversão e promiscuidade, com vereadores da oposição com pelouros e mandatos remunerados, o que os leva a não fiscalizar a acção da Câmara, porque estão comprometidos com o poder» e que, em consequência, «estas maiorias não são claras nem transparentes».

Ora a primeira observação que este juízo absolutamente temerário impõe é que, estando A. Guterres a falar de «maiorias que não são claras»,, só pode estar a referir-se às situações de maioria relativa de um partido, as quais apenas se verificam em 10% dos municípios existentes, o que, só por si, circunscreve consideravelmente a alegada gravidade do problema por si agitado e põe em evidência o absurdo de, por causa de supostas situações muito localizadas, dinamitar completamente um sistema que, globalmente, tem funcionado bem, desde há 24 anos.

Por outro lado, talvez o Secretário-geral do PS não tinha medido de forma precisa e sensata as consequências do que afirmou. É que das duas três : ou o PS, onde detém a maioria, compra vereadores de outras forças políticas com pelouros e mandatos remunerados, ou vereadores do PS deixam-se comprar pelos partidos maioritários noutros lados, ou ambas as coisas.

Em qualquer caso, o que seria útil, construtivo, transparente e muitíssimo mais moralizador que a sua proposta de lei era que o Eng. Guterres, em vez de disfarçar de Zorro em luta contra a «perversão» e a «promiscuidade», nos contasse quem são, com nomes de pessoas e de concelhos, os eleitos do PS que, politicamente, corrompem outros ou por outros se deixam corromper.

E se não fosse pedir de mais ao Eng. Guterres, o que ele verdadeiramente teria de explicar é porque é que, mesmo admitindo que pudesse haver situações como a que descreve em que vereadores da oposição não fiscalizam devidamente, a grande solução estaria num novo sistema em que os muitos que hoje fiscalizam seriam impiedosamente corridos das vereações municipais, onde - a bem de uma combativa fiscalização, como é bom de ver - só ficariam vereadores da mesma cor política, aí sim a praticarem em família as outras mais rendosas perversões e promiscuidades que bem se sabe.

 

Momento místico

Ele não o esperava mas,
repentino e suave, o milagre
chegou, glória a Deus nas alturas




29 outubro 2013

Uma bela ideia de Billy

A "Ode à Alegria" de
Beethoven agora com
letra e voz de Billy Bragg

"Billy Bragg sings Beethoven's
Ode to Joy from inspiration
«all men shall be brothers»"


See now like a phoenix rising
From the rubble of the war
Hope of ages manifested
Peace and freedom evermore!
Brothers, sisters stand together
Raise your voices now as one -
Though by history divided
Reconciled in unison

Throw off now the chains of ancient
Bitterness and enmity
Hand in hand let's walk together
On the path of liberty
Hark a new dawn now is breaking
Raise your voices no as one!
Though by history divided
Reconciled in unison

Furnish every heart with joy
and banish all hatred for good.

Por acaso...

... agora dava-me
mais jeito uma lei de limitação
do número de baratas



Assunção Cristas preparada para
a chacina canina (rima e é verdade).

Um avisado conselho do Governo !

"Aprendam
a surfar, portugueses"


 

A tragédia humana ...

... e o Muro
de que pouco se fala


À esquerda do muro: Nogales, Estado do Arizona, EUA; à direita, Nogales, Estado de Sonora, México.



a ler aqui

Um livro, edição da Princeton University,
sobre os «minutemen» - organização
de americanos que se voluntariam para
vigiar a fronteira e caçar emigrantes ilegais
.


28 outubro 2013

E por isto me fico !

Não, não me importo

Por uma vez, é assim mesmo. Não me importo nada que os leitores achem que fiquei, gelado e contraído, sem argumentos contra este texto de Daniel Oliveira publicado no Expresso online e reproduzido no «arrastão». Não me importo nada que os leitores me achem incapaz de fazer a simples e cândida pergunta sobre qual é o mal ou a estranheza de um partido evocar e celebrar o legado de um seu grande dirigente e o fazer pelos seus próprios olhos, critérios ou até conveniências políticas, já que isso não impede a expressão de outros olhares e outras opiniões. . Não me importo nada que os leitores julguem que eu nem sequer sou suficientemente penetrante para demandar a D.O. que me mostre onde é que algum responsável do PCP pretendeu equiparar Álvaro Cunhal ao nível teórico de «Gramsci, Rosa Luxemburgo, Lukács, Trotsky, Lenin e tantos outros», sem que isso lhe retire um milimetro a qualidade de «ideólogo» com a elevada dimensão que D.O. lhe pretende negar. Não me importo nada que os leitores me julguem desprovido daquele elementar bom-senso que me levaria a desmontar o baralhanço político ou «espírito de classe» que leva D.O. a sustentar e dar relevância a que Jerónimo de Sousa (e «à generalidade dos funcionários que o rodeiam», lá tinha de vir o temível labéu [*]) não teria a «capacidade de liderança intelectual» que Cunhal tinha ou a perguntar-lhe quem é que a tem no campo da concorrência. E até não me importo que os leitores julguem que eu não tenho a informação e a memória suficientes para, sem negar deficiências ou dificuldades do tempo presente, arrasar a tese de D.O. de que o PCP seria quase um deserto de quadros intelectuais com uma numerosa lista de qualificados intelectuais que ou são membros do PCP ou são seus companheiros de luta de muito próximos (embora "naturalmente" sem um centésimo da exposição mediática de Daniel Oliveira).

Não, por uma vez não me importo com nada disso e, por isso, aqui venho dizer que, pura e simplesmente, não discuto com quem alinhava um título assim para um seu texto. É que, feliz ou infelizmente, a mim não me tocou ganhar a vida como comentador profissional e, em consequência, não preciso de arranjar títulos «jeitosos» e «chamativos» para o Expresso online.

[*] Declaração de interesses: para quem porventura não o saiba, esclarece-se que o autor deste post e titular deste blogue foi funcionário do PCP durante 29 anos. E com muita honra.

Sobre um tema central que, a meu ver,
acaba por situar as próprias comemorações
do Centenário de Álvaro Cunhal
ler esta intervenção no Congresso: 

 aqui

Um livro estrangeiro por semana ( )

De l'abandon au mépris


 
Edições du Seuil, 15,86 E,

Extracto do prefácio:
«Non ! La trahison n'est pas la condition suprême du pouvoir. Elle n'est pas la loi souveraine des démocraties.»
Jean Jaurès

Avec le cinéaste Elio Pétri, la classe ouvrière allait au paradis ; avec les socialistes, c'est un voyage au bout de l'enfer qui lui est réservé. C'est à se demander si les responsables du parti à la rose - je ne parle pas ici des militants dont l'engagement et la sincérité ne sont pas discutables - ne sont pas nés sous la malédiction du scorpion de la fable, celui qui ne peut s'empêcher de piquer la grenouille sur le dos de laquelle il traverse le fleuve, quitte à périr avec elle, «parce qu'un scorpion est un scorpion» ; un socialiste étant un socialiste, ne peut-il s'empêcher de trahir ceux qui placent ses espoirs en lui, les ouvriers, les employés, les jeunes, les retraités, les classes populaires ?
Inutile de remonter à 14-18 où, Jaurès à peine enterré, les socialistes votent les crédits de la guerre, à l'abandon des républicains espagnols par le gouvernement de Léon Blum, à Munich, à Pétain, à qui ils accordent les pleins pouvoirs, à Jules Moch qui fait tirer sur les grévistes en 1947, à Guy Mollet et Mitterrand pendant la guerre d'Algérie... il suffit de considérer la période actuelle en prenant pour point de départ 1981.
La chronologie des reniements est sans appel : en 1982 la «pause» se mue en rigueur, en 1984 près de trente mille suppressions d'emplois dans la sidérurgie au nom de «la modernisation de l'industrie», en 1992 signature du traité de Maastricht scellant le contrôle de la politique économique de la France par Bruxelles, en 1997 fermeture de l'usine Renault de Vilvorde malgré tous les serments, toutes les promesses de s'y opposer, la même année, ratification d'un «Pacte de stabilité et de croissance» écornant une fois de plus la démocratie, en 1998 le journal Le Monde applaudit : «Lionel Jospin privatise plus vite qu'Alain Juppé», en 2005 une de Paris Match où Nicolas Sarkozy et François Hollande posent côte à côte dans le même costume, la même attitude, jumeaux plus effrayants que les frères Bogdanov, sans parler de Pascal Lamy qui s'enorgueillit d'accélérer la mondialisation, fer de lance du néolibéralisme... Passant du pire au pire avec une constance accablante, la liste est trop longue pour être poursuivie.
C'est hélas désormais une banalité de parler de «la gauche de droite» pour désigner les leaders du Parti socialiste, tant leur défense des intérêts des classes possédantes au nom de l'économie, de la bonne gestion et du dieu invisible des marchés se fait au prix d'un abandon partiel ou total des intérêts des classes populaires. Comment a-t-on pu en arriver là ?»

 
Do mesmo autor 

 E, 14,44
Apresentação do editor :«Fin des années 1970 : après 30 années de prospérité, le modèle keynésien s’essouffle et la crise économique s’installe. Les élites libérales, patrons, cadres dirigeants, gros actionnaires , contraintes au silence depuis l’après-guerre par les succès de l’Etat-providence et la peur du communisme voient venu le moment de reprendre l’offensive. C’est le début d’une revanche qui s’enracine d’emblée dans un slogan en forme de contrainte : « Il n’y a pas d’alternative ! » Dès 1983, François Mitterrand fait prendre à la France le tournant du libéralisme, Margaret Thatcher et Ronald Reagan sont au pouvoir, l’économie mondiale entre dans l’ère néolibérale. Sur une idée originale du spécialiste de l’économie Philippe Labarde, cet ouvrage démonte et analyse les stratégies de la conquête : quels acteurs au sein de quels réseaux ? Quels moyens servis par quelles méthodes ? Car la nouvelle coalition fait preuve d’une audace incontestable : plutôt que d’imposer ses valeurs, elle s’approprie celles de ses adversaires. Le conservatisme est décrié ? Elle démontre que les progressistes sont des conservateurs. La révolution est à la mode ? Elle se dit révolutionnaire. Mais au-delà de la dénonciation d’un discours, les auteurs retracent ici les étapes d’une prise de pouvoir, les choix politiques et économiques puis leur mise en oeuvre, nationale et internationale.