(para quem não tenha lido, outras palavras
minhas sobre o 1 de Outubro aqui).
Numa coisa estou pronto a fazer justiça ao actual governo: é quando reconheço que, desde o 25 de Abril, nunca houve um governo assim que, por razões de disfarce, combinasse tão sofisticadamente uma política ao serviço dos poderosos como pequenos gestos de caridade e compaixão pelos pobrezinhos.
E termino com duas observações complementares:
- a primeira , que tem alguma ironia histórica, é para lembrar que com esta medida este governo de direita imita o errado desprezo e hostilidade que, em algumas circunstância, alguns países socialistas tiveram em relação à questão dos «estímulos materiais»; desconfio por isso que as consabidas piadas, em regra ligeiras, sobre a «construção do homem novo» passarão a ter outros destinatários;
- a segunda é que com esta coisa de serem os premiados a escolher quem são os carenciados da sua escola que, em seu lugar, vão receber os 500 euros, ainda não percebi o que acontecerá se, por bambúrrio, um dos premiados pertencer ele próprio ao grupo dos «carenciados».
Santo Deus, para o que estávamos guardados: os valores do chamado «Portugal profundo», longa e sistemática consolidados ao longo de 48 anos de ditadura, duram, duram, duram muitíssimo mais que a pilha do anúncio, porra.
5. Remato, para já, lembrando que este não é o primeiro caso nem será provavelmente o último em que o Governo do PSD, nuns casos aliado ao PS e noutros com este a fazer de oposição decorativa, se serve da crise como manto protector para tentar acelerar recuos democráticos que sempre desejou com crise ou sem ela, como aliás também é patente em relação aos direitos dos trabalhadores.
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Carlos Carvalhas no XV Congresso do PCP (1996)
«(...) Mas, para além disso, consideramos particularmente inquietantes as possibilidades de um acordo entre o PS e PSD quanto à alteração do sistema de eleição das Câmaras municipais e do sistema de eleição da Assembleia da República, em ambos os casos afectando gravemente o respeito pela proporcionalidade.
Quanto às Câmaras Municipais, a dificuldade está em saber qual das propostas - se a do PSD se a do PS - é mais antidemocrática.
O PSD quer que o partido mais votado, mesmo que não tenha a maioria absoluta, receba um bónus administrativo por forma a ter sempre direito a uma maioria absoluta de vereadores.
E o PS tem o atrevimento de pretender acabar com o direito e a prática que os portugueses exercem há 20 anos de elegerem directamente as Câmaras Municipais pelo sistema proporcional, e poderem assim determinar e escolher quem são os vereadores do Executivo municipal.
Segundo a aberrante proposta do PS, deixaria de haver eleição para as Câmaras Municipais e o Presidente da Câmara seria o candidato mais votado da lista para a Assembleia Municipal que ficaria investido do poder absoluto de escolher a seu bel-prazer todos os vereadores.
Queremos deixar absolutamente claro que a nossa total oposição a esta proposta não tem nada que ver com cálculos de ganhos e de perdas e só tem que ver com a nossa firme convicção de que o sistema actual - permitindo uma representação pluralista nas Câmaras Municipais, ao permitir que a gestão municipal seja fiscalizada a partir da própria vereação e ao permitir que vereadores da oposição possam exercer pelouros - tem um grande e insubstituível valor democrático.