19 dezembro 2018

Relembrando para quem não conheça

No aniversário do
assassinato de José Dias
Coelho, as palavras de José
Cardoso Pires há quase 45 anos


(...)Uma simplicidade imediata fazia com que tudo nele, ideias, gestos, convívio, fosse um discorrer expontâneo – ou uma entrega confiante, se quiserem. Revejo-o em 1945 numa concentração na Faculdade de Ciências; ou em certas tardes à mesa do velho Chiado (o café e a “Pomba de Picasso” em cima do tampo de mármore); nos passeios do MUD Juvenil (outro roteiro de politização) – percorro, em suma, todo um passado activo de iniciação, de prisões e de alegrias, e encontro sempre aquele sorriso, tão dele, a perdurar sobre o eco e a recordação.
[...] Um espaço, uma reticência da memória, e retomo Dias Coelho, agora no Movimento da Paz – Paz, execução dos Rosenberg, milhões de assinaturas a dizer não à morte (a maior declaração por escrito de toda a humanidade, estou certo). Ehrenbert e Eluard, tanta coisa. Aqui, no país muralhado com juizes do Plenário sentados em torres sinistras, também a Paz era difícil. Contudo triunfava, e era nossa. Na grande leva de obreiros que a erguiam lá estava Dias Coelho desenhando cartazes, presente em reuniões, angariando fundos, e sempre com aquele sorriso de camponês citadino que lhe iluminava a voz e o olhar.
Assim fazíamos, ele, eu, toda uma geração, a aprendizagem da vida. Procurávamos, quer isto dizer, saboreá-la no mais simples e no mais denso que ela oferecia, e talvez por isso é que, muitos anos mais tarde, ao ler

    Em toda a parte há
    um pedaço de mim
    que se quer dar

eu tenha reconhecido subitamente a assinatura do homem que fez esses versos: o José Coelho, o companheiro que se repartia e estava inteiro no bom e no difícil, no prazer e na coragem. (...)


Aqui a intervenção de José Cardoso Pires na homenagem a José Dias Coelho, na Sociedade Nacional de Belas Artes, a 19 de Junho de 1974

Sem comentários:

Enviar um comentário