Um desnecessário
floco de nevoeiro político
Porque o debate democrático de ideias não pode abdicar da frontalidade e franqueza, lamento tão sincera quanto profundamente que, em conferência de imprensa hoje realizada, o Prof. José Reis, respeitável personalidade que é um dos mais destacados promotores do Congresso Democrático das Alternativas, tenha incluído nas suas declarações, em geral justas e pertinentes, um apelo a que os partidos de oposição "aceitem sair das suas trincheiras" (aqui aos 15 m.) e passem a um diálogo ainda que crítico.
A este respeito, começo por voltar a lembrar que o diálogo entre forças políticas não é apenas coisa de negociações formais ou salas de reunião, antes acontece no espaço público e à vista de toda a gente através da manifestação das posições de uns sobre as propostas de outros e vice-versa, assim se evidenciando as convergências ou as discordâncias , como tem estado bem patente nestes dias.
Acontece que, a meu ver, é nanifestamente pouco feliz esta referência às «trincheiras» e que se trata de é um apelo de efeito fácil mas que releva de um carácter salomónico e superficial, filho de uma equitativa distribuição de responsabilidades que, como o Prof. José Reis saberá tão bem como eu, é injusta e sem aderência à realidade.
Com efeito, o Prof. José Reis não pode deixar de saber, bem no concreto, de que diferentes e distanciadas orientações, propostas e valores se faz aquilo a que chamou de "trincheiras". Mais: ele próprio e os outros promotores do C.D.A. terão em relação a elas, as suas próprias simpatias ou antipatias, concordâncias e discordâncias, proximidades e distâncias.
Talvez haja uma pergunta que possa iluminar esta questão: que diria o Prof. José Reis se, em resposta ao seu apelo, o PS lhe respondesse assim: "Sair das trincheiras ? Então porque não sai o Congresso Democrático das Alternativas da sua [justíssima, digo eu] trincheira da posição anti-memorandum que é um elemento fundador e estrutural da convocatória dessa iniciativa ? ".
Estou quase certo que, em tal caso, o Prof. José Reis, por sua vez, responderia algo assim:" primeiro, não é adequado, para não dizer que não é sério, chamar "trincheira" ao que são firmes convicções de esquerda; segundo, não há nenhum desejo de entendimento à esquerda que possa ser alicerçado no rasgar de convicções que a própria realidade se está encarregando de mostrar a sua justeza".