«A deputada socialista Gabriela Canavilhas fez ontem um
“desabafo” (a palavra é sua) no Twitter acusando este jornal de publicar
“factos falsos” sobre a manifestação deste sábado a favor da escola pública, e
apelando – de forma populista – ao despedimento da autora da notícia, a
jornalista Clara Viana.
Não sabemos se a ideia foi de Canavilhas, mas ao longo
do dia recebemos também cartas de leitores – quase milimetricamente iguais –
indignados com essa mesma notícia e criticando, na essência, dois factos. 1)
termos escrito que, segundo a PSP, estiveram na manifestação da Fenprof 15 mil
e não as 80 mil pessoas calculadas pelo sindicato; 2) e que Catarina Martins e
Jerónimo de Sousa tinham estado no palco ao lado de Mário Nogueira, Ana
Benavente, Arménio Carlos e Helena Roseta.
Sobre os políticos, cometemos de facto um erro, já
corrigido. Os líderes do BE e do PCP estiveram em frente ao palco – como todos
vimos na televisão – mas não em cima do palco.
Sobre a primeira questão – a que de facto irritou
Canavilhas – algumas considerações. O PÚBLICO citou dois números:
o da organização (80 mil) e o da PSP (15 mil). Alguns jornais, é verdade,
citaram apenas a Fenprof. Canavilhas terá preferido essas notícias. A deputada
escreve como se a sua opinião fosse um facto científico inquestionável e não
soubéssemos todos que a guerra dos números é sempre controversa e de natureza
política.
Mesmo métodos mais rigorosos do que a contagem “a
olho” suscitam polémica. Sobretudo porque, em regra, calculam muito abaixo dos
números anunciados por quem organiza. Quem organiza tem paixão. Quem é parte
desinteressada é à partida mais distante e imparcial. Canavilhas deve
conhecer Clark McPhail, que se inspirou em
Herbert Jacobs, que também muito influenciou Steven Doig – três fanáticos das
contagens de multidões. Nos anos 1990, depois de uma guerra
que chegou aos tribunais, o Congresso dos EUA proibiu até a polícia de tornar
públicas as suas estimativas da dimensão de manifestações.
Espanta por tudo isto que uma deputada
que foi ministra da Cultura caia nesta velha ratoeira. A próxima vez que
Canavilhas quiser acusar o PÚBLICO de publicar “factos falsos” deverá fazer
melhor o seu trabalho de casa.»
Tudo visto, o que tenho para oferecer
aos autos, em curto, é o seguinte:
1. O «Público» achou que as palavras (parcialmente
insensatas e condenáveis) de G. Canavilhas eram uma oportunidade de ouro para
fazer esquecer todas as críticas documentadas e sustentadas que lhe tem sido
dirigidas por causa da sua parcialidade nesta matéria dos contratos de
associação com os colégios privados.
2. Com efeito, trata-se no fundo de soprar
na palha (Canavilhas) para esconder o grão, ou seja designadamente a ostensiva
diversidade de tratamento gráfico e de destaques dados pelo jornal às posições
favoráveis às pretensões e iniciativas dos colégios privados e às posições e
iniciativas dos que se lhes opuseram. (exemplo; manchete dada a uma alegada posição do Tribunal de Contas favorável
aos colégios (dada ao «Público» pelos colégios) com o desmentido do TC remetido
para uma página interior no dia seguinte).
3. O mesmo «Público» que agora quis colocar os seus
leitores perante o aflitivo dilema dos 80 mil dos organizadores ou os 15 mil da
«polícia» e que, neste comunicado, salienta que a contagem de manifestantes
suscita sempre polémica, já aquando da manifestação dos colégios
privados assumiu como bons e incontroversos os números fornecidos pelos
organizadores e não colocou nenhum dilema numérico aos seus leitores. E, hoje
mesmo, na peça da sua página 17, há uma legenda de fotografia que volta à
vaca fria e onde se pode ler : «Manifestação foi convocada no mesmo dia em que
os colégios levaram à
rua cerca de 40 mil»
4. A caminho do fim, importa sublinhar que o
Público ao reconhecer que cometeu um erro ao «colocar» no palco Jerónimo de
Sousa e Catarina Martins procura passar por um assunto deontologicamente
gravíssimo como cão por vinha vindimada ( e aqui Canavilhas esteve muito bem).. Na verdade, não chega reconhecer o
erro. Importa que seja explicado como aconteceu
um erro desta natureza numa reportagem assinada por uma jornalista, sendo suposto que tenha
estado lá (ou não ?).
5. Concedo que a
direcção editorial do «Público» possa não ter de fazer nenhum trabalho de casa.
Mas que um trabalho de sério exame de consciência
lhe faria bem, lá isso faria.