Indonésia, 1965
Em boa hora, o Público de hoje dá hoje uma página inteira a uma peça de Vasco Câmara sobre a apresentação no Festival de Veneza do documentário de Joshua Oppenheimer (na foto) The Look of Silence com o qual, depois de Act of Killing, volta à matança de comunistas e outros progressistas na Indonésia em 1965. Quanto ao mais, permito-me reeditar a minha crónica sobre este tema no Avante! de 19.8.2001.
Indonésia,
1965
Acredite-se
que não é por preguiça de Agosto que esta crónica quase se
limitará a citar matéria publicada no «Le Monde» de 30/7 e no
«Público» de 2/8. É antes porque, às vezes, alargar a circulação
de informação e o correspondente conhecimento de certos factos é
mais útil do que carradas de comentários.
Para
quem não leu aqueles jornais, diga-se então que se trata de
arrasadoras confirmações do consciente envolvimento dos EUA no
massacre de centenas de milhares de comunistas indonésios na
sequência do golpe reaccionário de 30 de Setembro de 1965 que viria
a depor o Presidente Sukarno e a instaurar a ditadura de Suharto.
Essas
revelações são extraídas de documentação da CIA e do
Departamento de Estado que, embora com a enervada oposição destas
duas entidades, acabou por ser publicado pelo GPO (algo semelhante à
nossa Imprensa Nacional) num volume que se encontra disponível na
Net (em www.nsarchive.org) graças à meritória actividade do
National Security Archive da Universidade George Washington.
E,
nesse âmbito, registe-se então que, em telegrama de 15.4.1966,
Marshall Green, embaixador dos EUA na Indonésia, declarava que «
nós não sabemos francamente se o número exacto (de
comunistas assassinados) está
mais próximo dos 100 mil ou do milhão, mas achamos que é mais
sensato admitir o número mais baixo, sobretudo face à imprensa».
Registe-se
então que a embaixada norte-americana forneceu aos generais
indonésios promotores do golpe listas de dirigentes e quadros
comunistas que na sua maioria foram executados.
Registe-se
que, segundo esta documentação mantida secreta durante 35 anos, a
própria CIA considerou que «em
termos de número de mortos,
os massacres anti-PKI figuram
entre os piores assassinatos em massa do século XX»,
embora na altura a «Time» lhes chamasse
«as melhores notícias da Ásia para o Ocidente dos últimos anos».
Registe-se
que, em nota de 2.12.65, William Bundy, vice-secretário de Estado
para o Extremo Oriente, escrevia que «serve
esta para confirmar que fornecemos a Malik 50 milhões de rupias que
ele pediu para financiar o movimento Kap-Gestapu» (
apropriado nome de um dos mais eficazes grupos de assassinos).
Prestada
a informação essencial, só nos resta registar que este horrível
banho de sangue patrocinado pelos EUA nunca é evocado anualmente
pelas televisões, ao contrário do que sucede com alguns outros
dramas e tragédias do século XX.
E
registar que, ao contrário do que injustamente aplicam aos
comunistas portugueses, as personalidades e forças políticas
nacionais amigas da política norte-americana e defensoras do
capitalismo nunca aceitam responder e considerar-se ideologicamente
corresponsáveis por esta generalizada matança de comunistas.
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