Não há meio de aprenderem !
Em artigo hoje no Público, obviamente recheado de invocações e citações de Edmund Burke e Alexis de Tocqueville, José Manuel Fernandes resolveu dar como boa a recente afirmação de Abebe Selassie de que «Portugal é um dos países que mais gasta com pensões» ( embora o próprio reconheça que, simultaneamente «tem uma das proporções maiores de idosos em risco de pobreza»).
Mais à frente, torna-se patente que José Manuel Fernandes alude indiferenciadamente a «despesas sociais» e a «prestações sociais», que não são exactamente a mesma coisa, e atira tudo isso para despesas ou encargos do Estado.
Por isso, embora com algum cansaço para alguns leitores, volta a ser necessário explicar a tanta gente que escreve nos jornais e fala nas televisões que grande parte das prestações sociais (pensões, reformas, abono de família, subsídios de doença, de funeral e de desemprego, designadamente) não são pagas com os impostos cobrados aos cidadãos mas sim pelo Orçamento da segurança Social com recurso ao acumulado dos descontos dos trabalhadores e das entidades patronais.
Esta verdade e esta regra têm natural e justamente excepções já que é o Orçamento de Estado e os impostos cobrados que suportam os encargos, por exemplo, com os regimes não contributivos, o que acontece desde que, em boa hora, se pôs fim a uma prática de 10 anos de cavaquismo que se calcula ter prejudicado a segurança social em cerca de mil milhões de contos.
Já vem de longe esta concepção ou percepção de que as pensões e reformas seriam uma benesse do Estado para o que, ao contrário do que sucede noutros países europeus, em muito terá contribuido, em Portugal ter sido sempre relativamente fraca a consciência de que a segurança social é sobretudo um património comum dos trabalhadores.
E só aquela erradíssima concepção poderá explicar o facto ainda hoje muito pouco conhecido de um Orçamento de Estado anterior (o de 2013 deve ter mantido isso), em puro contrabando legislativo, ter legislado no sentido de que os reformados da segurança social se porventura recebessem qualquer tipo de remuneração de entidades públicas teriam de optar por uma delas - a reforma ou a remuneração, o que na maioria dos casos, significariam trabalharem, de forma esporádica ou continuada, à borla para qualquer entidade pública.
O desconchavo desta disposição fica bem à vista se se perceber que um aposentado pela Caixa Geral de Aposentações pode auferir o que quiser de entidades privadas mas já um reformado da segurança social mesmo que, como eu, tenha 42 anos de carreira contributiva no sector privado, já não pode acumular a sua reforma nem com um cêntimo recebido por qualquer trabalho prestado a uma entidade pública.
Ora isto, ofende manifestamente, dois princípios que deviam ser sagrados: o primeiro é que a reforma, desde que reunidos os exigidos requisitos legais, é um direito adquirido e não uma proibição de continuar a trabalhar, se essa for a vontade dos cidadãos em causa; a segunda é que o trabalho de qualquer tipo deve ser remunerado.
E, por causa disto, certamente que poucos leitores o saberão,
houve cidadãos que ou deixaram de fazer qualificados programas para a RDP ou de nela participarem em termos de comentário político ou então, em bofetada de luva branca continuam hoje a gastar tempo, esforços e trabalho não despiciendos para os manter não recebendo um cêntimo sequer por isso e inevitavelmente ainda gastando algum do seu bolso.