Pronto, culpemos o Verão
Na opus que vem folhetinando nas suas crónicas no Público sobre «uma refundação democrática ?», Rui Tavares começou ontem por «arriscar, porém, que mais de 99% dos portugueses desconhece o nome do chefe da missão portuguesa no Conselho Europeu, ao qual compete a representação de Portugal (...)». E explica-nos que a União Europeia não tem um Senado «mas tem um Conselho, onde estão os governos , mas onde cada missão nacional chamada «Representação Permanente» (REPER) é em geral dirigida por um burocrata ou diplomata de carreira».
Pois Rui Tavares, no seu afã de «refundação democrática», vem propor que Portugal passe a eleger (suponho que voto universal) o seu chefe de REPER e, esquecido de que para isso mesmo podem servir as eleições para o Parlamento Europeu e as legislativas, logo adianta que « essa eleição seria uma excelente ocasião para discutir a nossa estratégia europeia, para fazer perguntas aos candidatos sobre alterações aos tratados, convocação de uma Convenção Europeia, prioridades eurolegislativas, transparência das reuniões, cooperação com os governos, etc.»
Como já antes Rui Tavares tinha defendido vivamente que a União Europeia tivesse um chefe de governo eleito directamente e em simultâneo por todos os eleitores dos 27 países membros da UE, já são mais duas eleições que o eurodeputado ex-BE e actual Verdes propõe no espaço de pouco tempo.
Tudo visto, esta faiscante proposta de Rui Tavares levaria a que os portugueses, que não elegem directamente o seu governo (lembro que PSD e CDS nem sequer concorreram coligados às últimas eleições), passariam entretanto a eleger directamente, calcula-se que com uma impressionante participação eleitoral, o chefe da REPER portuguesa.
Rui Tavares termina a sua crónica de ontem no Público desta forma simultaneamente triunfal e calmante : «E o que é melhor: ninguém nos pode impedir de o fazer».
Por uma vez, dou-lhe inteira razão: com efeito, bastaria assassinar o bom senso, matar a lucidez política e alterar pelo menos a Constituição da República portuguesa já que esta dispõe claramente que a soberania popular se exerce nas formas previstas na Lei Fundamental.
Eu sei muito bem o que é estar a meia hora de ter de entregar uma crónica, olhar o ecrã do computador e não ter nem uma ideia sobre o que escrever, o que me dota de bastante tolerância sobre o que outros por vezes escrevem. Infelizmente, creio bem que não é uma situação desta que explica as «refundações» de Rui Tavares.