"Guerra e paz"
Manuel Loff no «Público» de 19/2
«(,,,) A discussão sobre a necessidade de nos armarmos até aos dentes vai muito para lá do velho argumento da guerra como “política por outros meios” (von Clausewitz, 1832) e de todo o argumentário que, consoante as gerações e os contextos, justificou a corrida ao armamento com a ameaça soviética, depois a iraquiana, a norte-coreana, a islamista, agora a russa – e estamos à espera de que se justifique com a ameaça norte-americana a territórios UE como a Gronelândia, já agora. A securitização é, em si mesma, uma forma de regime (político, económico, social), baseado na velha tese autoritária de que nenhuma forma de liberdade e nenhum direito (individual, social) podem ser usufruídos sem que primeiro se garanta a segurança – isto é, nunca. É fundamentalmente o modelo israelita de sociedade. A ordem social e política securitária alimenta-se não apenas da sucessão de “ameaças” externas, mas também da identificação obsessiva de inimigos internos (a contestação social e política descrita como subversão e crime, os movimentos sociais e as greves como “desordem”, as minorias étnicas e religiosas como ameaças ao “nosso modo de vida”, os migrantes como “invasores”, a diversidade de modelos de vida como “ataque à família”).
Por uma via ou pela outra, o securitarismo reforça sempre este impulso autoritário que, como bem se vê desde o 11 de Setembro de 2001, tem avançado pelo planeta inteiro, mas muito particularmente pelo Ocidente, que tão arrogantemente justifica tudo quanto faz como defesa da democracia mas em cujas maiores potências se instala um autoritarismo e uma hipervigilância que associa imbricadamente Estado, as Big Tech e o complexo militar-industrial. (,,,) »