20 junho 2016

E eles a tratarem-nos por tontinhos


«A deputada socialista Gabriela Canavilhas fez ontem um “desabafo” (a palavra é sua) no Twitter acusando este jornal de publicar “factos falsos” sobre a manifestação deste sábado a favor da escola pública, e apelando – de forma populista – ao despedimento da autora da notícia, a jornalista Clara Viana.
Não sabemos se a ideia foi de Canavilhas, mas ao longo do dia recebemos também cartas de leitores – quase milimetricamente iguais – indignados com essa mesma notícia e criticando, na essência, dois factos. 1) termos escrito que, segundo a PSP, estiveram na manifestação da Fenprof 15 mil e não as 80 mil pessoas calculadas pelo sindicato; 2) e que Catarina Martins e Jerónimo de Sousa tinham estado no palco ao lado de Mário Nogueira, Ana Benavente, Arménio Carlos e Helena Roseta.
Sobre os políticos, cometemos de facto um erro, já corrigido. Os líderes do BE e do PCP estiveram em frente ao palco – como todos vimos na televisão – mas não em cima do palco.
Sobre a primeira questão – a que de facto irritou Canavilhas – algumas considerações. O PÚBLICO citou dois números: o da organização (80 mil) e o da PSP (15 mil). Alguns jornais, é verdade, citaram apenas a Fenprof. Canavilhas terá preferido essas notícias. A deputada escreve como se a sua opinião fosse um facto científico inquestionável e não soubéssemos todos que a guerra dos números é sempre controversa e de natureza política.
Mesmo métodos mais rigorosos do que a contagem “a olho” suscitam polémica. Sobretudo porque, em regra, calculam muito abaixo dos números anunciados por quem organiza. Quem organiza tem paixão. Quem é parte desinteressada é à partida mais distante e imparcial. Canavilhas deve conhecer Clark McPhail, que se inspirou em Herbert Jacobs, que também muito influenciou Steven Doig – três fanáticos das contagens de multidões. Nos anos 1990, depois de uma guerra que chegou aos tribunais, o Congresso dos EUA proibiu até a polícia de tornar públicas as suas estimativas da dimensão de manifestações.
Espanta por tudo isto que uma deputada que foi ministra da Cultura caia nesta velha ratoeira. A próxima vez que Canavilhas quiser acusar o PÚBLICO de publicar “factos falsos” deverá fazer melhor o seu trabalho de casa.»

Tudo visto, o que tenho para oferecer aos autos, em curto, é o seguinte: 

1. O «Público» achou que as palavras (parcialmente insensatas e condenáveis) de G. Canavilhas eram uma oportunidade de ouro para fazer esquecer todas as críticas documentadas e sustentadas que lhe tem sido dirigidas por causa da sua parcialidade nesta matéria dos contratos de associação com os colégios privados.

2. Com efeito, trata-se no fundo de soprar na palha (Canavilhas) para esconder o grão, ou seja designadamente a ostensiva diversidade de tratamento gráfico e de destaques dados pelo jornal às posições favoráveis às pretensões e iniciativas dos colégios privados e às posições e iniciativas dos que se lhes opuseram. (exemplo; manchete dada a uma alegada posição do Tribunal de Contas favorável aos colégios (dada ao «Público» pelos colégios) com o desmentido do TC remetido para uma página interior no dia seguinte).

3. O mesmo «Público» que agora quis colocar os seus leitores perante o aflitivo dilema dos 80 mil dos organizadores ou os 15 mil da «polícia» e que, neste comunicado, salienta que a contagem de manifestantes suscita sempre polémica,  já aquando da manifestação dos colégios privados assumiu como bons e incontroversos os números fornecidos pelos organizadores e não colocou nenhum dilema numérico aos seus leitores. E, hoje mesmo, na peça da sua página 17, há uma legenda de fotografia que volta à vaca fria e onde se pode ler : «Manifestação foi convocada no mesmo dia em que os colégios levaram à rua cerca de 40 mil»

4. A caminho do fim, importa sublinhar que o Público ao reconhecer que cometeu um erro ao «colocar» no palco Jerónimo de Sousa e Catarina Martins procura passar por um assunto deontologicamente gravíssimo como cão por vinha vindimada ( e aqui Canavilhas esteve muito bem).. Na verdade, não chega reconhecer o erro. Importa que seja explicado como aconteceu um erro desta natureza numa reportagem assinada por uma jornalista, sendo suposto que tenha estado lá (ou não ?).

5. Concedo que a direcção editorial do «Público» possa não ter de fazer nenhum trabalho de casa. Mas que um trabalho de sério exame de consciência lhe faria bem, lá isso faria.


2 comentários:

  1. O Público anda a deriva entre a obrigação de ser a voz do dono e a necessidade de parecer independente e sério . Pode escolher as cartas ao director para publicação mas não os comentários das redes sociais . Uma lástima que não terá vida longa .

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  2. e a PSP já fez saber que não divulgou números...
    abraço
    Vasco

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